300
Título Original: "300" (2006) Realização: Zack Snyder Argumento: Zack Snyder & Kurt Johnstad Actores: Gerard Butler – Leónidas Lena Headey – Gorgo Dominic West – Theron David Wenham – Dilios Rodrigo Santoro - Xerxes |
Frank Miller esteve de costas voltadas para o cinema durante década e meia. Tendo reabilitado os comics da Marvel (Demolidor e Elektra) e da DC (Batman) nos anos setenta e oitenta, foi na madrugada de 1990 que escreveu o guião para a sequela de RoboCop e se sentiu injustiçado pelos cortes e alterações que o seu texto sofreu. Ainda tentou que o seu nome fosse retirado do genérico, mas nem daí nem do RoboCop III, supostamente baseado em ideias que ficaram de fora no guião escrito para RoboCop II. O argumento integral viria a ser transformado numa mini-série de banda desenhada, pela editora Avatar.
Em 2005, Robert Rodriguez restituiu a Miller o gosto pela sétima arte (entretanto considerado já um Deus da nona), com uma fiel abordagem a Sin City, tarefa hercúlea comprovada por todos aqueles familiarizados com a graphic novel. Depois deste sucesso planetário, as portas foram escancaradas e a passadeira vermelha aguardava-o, com gente como Christopher Nolan a dizer que ele sempre o inspirara. Enquanto Sin City 2 (agendado para este ano) não chega, é a vez do seu épico medieval avançar pelas telas mundiais. 300 é a segunda adaptação directa de uma graphic novel de Frank Miller. História do género David e Golias, coloca um punhado de trezentos soldados espartanos a enfrentar um exército de milhões, que pretende invadir o seu território e tornar Esparta, Cidade-Estado livre, sob o jugo de Xerxes, rei da Pérsia. É a história de Leónidas, o Leão de Esparta, que se recusa a prestar vassalagem, na forma simbólica de uma amostra de água e terra, ao Rei invasor. Tem como pano de fundo a batalha de Termópilas, em 481 a. C., em que 300 espartanos mataram mais de 20 mil persas.
É um filme belicista, marcial, por vezes brutal, assentando numa caracterização extremamente próxima dos desenhos de onde retira o nome. Os heróis são musculosos, inflexíveis, impenetráveis. Combatem apenas de cuecas e capacete, só pensam na vitória ou em serem mortos por um adversário de respeito. Desde o nascimento, são modelados de corpo e alma para serem os guerreiros mais implacáveis e não cederem perante nenhum perigo. Agora, na mais dura batalha das suas vidas, poderão provar o seu valor da única forma que sabem. Até à morte.
O governo do Irão insurgiu-se contra 300, devido ao facto dos Persas serem seus ascendentes, clamando por erros históricos na narrativa e gritando que Hollywood lança mais uma acha na fogueira contra o Médio Oriente. Isto será facilmente contra-argumentável, pois os heróis de 300 têm uma educação demasiado ariana, de sangue puro e superior (os bebés deformados são sacrificados ao nascerem, aos sete anos são abandonados em terra selvagem para sobreviverem ou perecerem, são treinados na arte da guerra e primam pouco pelo dom da palavra), para serem apontados como modelo comportamental a seguir. Ao longo do filme, fala-se em liberdade e auto-determinação, mas assistimos a pouco disso entre os heróis. Companheirismo e honra, sim (até mais do que na graphic novel, onde até para com os semelhantes os espartanos eram implacáveis), mas isso é uma característica presente em todos os filmes de guerra.
Um curioso feminismo encapotado pode também ser encontrado: Leónidas não dá um passo sem consultar a rainha; e os oráculos são as mais belas mulheres de Esparta – elas é que são a voz dos Deuses (ainda que sejam os sacerdotes a traduzir a estranha língua dos oráculos).
Algumas das frases mais significativas do filme foram de facto, rezam os relatos da época, expressos pelos guerreiros reais. Quando um general de Xerxes ameaçou que as suas flechas eram tão numerosas que obscureceriam o sol, Dieneces, segundo Heródoto (no Livro VII do Desastre das Termópilas), afirmou que então combateriam à sombra. E Leónidas disse realmente aos seus homens que almoçassem bem, porque “esta noite jantaremos no Inferno!”.
Uma das grandes vantagens de 300 acaba por revelar-se igualmente um defeito. O poderoso e surpreendente grafismo, assente na originalidade da paleta de Lynn Varley (colorista da graphic novel e esposa de Frank Miller), promove a queda, já que a crueza das imagens se dilui pela repetição, a originalidade torna-se monotonia, o fosco dos ocres para o dia e dos azuis para a noite acaba por ser redutor e os céus colam-se ao cenário e aos personagens, provocando algum cansaço. A intriga de corte é outro peso morto. Falta-lhe garra, os discursos são demasiado transparentes, arremesso de frases feitas, fazendo resvalar o ritmo das batalhas até ao bocejo.
Em conclusão, 300 é um filme empolgante, mas que vai morrendo lentamente na sua própria premissa. É pouco mais do que um Rocky, um combate de boxe desigual, mas travado com coragem e determinação. Visualmente tratado como um Gladiador em desenho animado, sucumbe pela falta de emoções subsequentes ao impacto inicial.
® Ricardo Lopes Moura
1 Comments:
Sem dúvida, ótimo! O filme é testosterona pura.
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