Ghost World - Mundo Fantasma
Título Original: "Ghost World" (2001) Realização: Terry Zwigoff Argumento: Terry Zwigoff & Daniel Clowes Actores: Thora Birch – Enid Scarlett Johansson – Becky Steve Buscemi – Seymour Brad Renfro - Josh |
Um daqueles filmes que passou injustamente despercebido em 2002, Ghost World - Mundo Fantasma destacou-se, contudo, como um dos mais surpreendentes desse ano, tornando-se instantaneamente numa obra de culto.
Embora seja um filme norte-americano sobre adolescentes, não cai no caminho mais óbvio e convencional das piadas fáceis e referências a sexo de 2 em 2 minutos, recusando igualmente personagens baseadas em estafados clichés. Adaptando para a sétima arte a obra de banda-desenhada homónima de Daniel Clowes - um dos mais estimáveis autores underground norte-americanos -, Terry Zwigoff apresenta um filme que diverge em tudo da lógica dos tradicionais comics de super-heróis que têm marcado grande parte da produção cinematográfica recente made in USA.
Aqui não há efeitos especiais impressionantes nem intrépidos protagonistas, mas um universo minimalista povoado por gente normal que vive um quotidiano melancólico e pouco reluzente. Assim, foca-se aqui a alienação, o consumismo ou as (sub)culturas urbanas vistas pela óptica de duas adolescentes desalinhadas.
Enid (Thora Birch, de Beleza Americana) é uma jovem inteligente e criativa que, ao terminar o liceu, questiona quais as perspectivas para o seu futuro e os rumos a seguir numa nova fase da sua vida. Acompanhada pela sua melhor (e única?) amiga Rebecca (Scarlett Johansson, antes do boom de Lost in Translation - O Amor é um Lugar Estranho), Enid vive um tenso processo de crescimento onde a chegada da idade adulta está cada vez mais próxima, trazendo uma carga de responsabilidades e escolhas que devem ser feitas.
As duas amigas, quase sempre afastadas dos colegas, nunca estiveram muito interessadas em integrar-se, mas pela primeira vez apercebem-se de que talvez devam - ou terão de - fazê-lo. Valerá a pena? E qual o preço a pagar pela integração?
Terry Zwigoff combina eficazmente drama e comédia, tornando Ghost World - Mundo Fantasma numa obra que segue a melhor tradição das dramedies características de domínios do cinema indie. Irónico e sarcástico sem deixar de ser genuíno e emotivo, o filme é um intenso retrato da realidade mundana e monótona dos subúrbios, onde jovens outcasts isolados lidam com o desencanto de ambientes vincados pela inércia.
A espaços, surge por aqui o humor ácido próximo da série de animação Daria, da MTV, embora a película de Zwigoff seja mais profunda e intimista. O ritmo da narrativa é, por vezes, demasiado lento e arrastado, mas acompanha bem os cenários de monotonia e tédio que envolvem as personagens, dotando o filme de um realismo simultaneamente envolvente e claustrofóbico.
Ghost World - Mundo Fantasma é um incomum olhar sobre os nerds e os falhados que, apesar do seu potencial, acabam por ser sempre ignorados ou desprezados e, por isso, são quase invisíveis, como fantasmas. Com uma vida social quase nula, tornam-se gradualmente incapazes de estabelecer laços e relações com os que os rodeiam, habitando áridas esferas de solidão. Enid, mais do que Rebecca, incorpora esses elementos, e quando tenta aproximar-se de alguém apercebe-se de que é usada e magoada.
Um dos mais entusiasmantes e memoráveis filmes norte-americanos recentes, Ghost World - Mundo Fantasma é uma discreta pérola que expõe com sensibilidade e alguma crueza a vertente angustiante, dolorosa e solitária do processo de crescimento, juntando-se a títulos igualmente recomendáveis como Donnie Darko de Richard Kelly, L.I.E. de Michael Cuesta, Elephant de Gus Van Sant ou SubUrbia, de Richard Linklater.
® Gonçalo Sá
3 Comments:
Se tem a minha musa Scarlett, só pode ser um bom filme :P!
Cumprimentos cinéfilos
Por acaso é um filme que também me passou ao lado. Tinha tudo para ser um grande filme do cinema independente norte-americnao: um realizador de prumo ( Terry Zwigoff), actrizes e actores excepcionais ( do excelente Steve Buscemi a Scarlett Johansson) e uma BD, dizem os entendidos( eu admito não a conhecer) , com enormes potencialidades.
Eu vi o filme e fiquei desiludido, apesar de lhe reconhecer alguma envolvência dramática. Talvez por fluir tudo na arte do decorativo, e do artificial ( a imposição do formato BD descamba lamentavelmente muitas vezes para aqui). Enfim, falaste também de outro filme que me desiludiu de sobremaneira, mas este pelo seu impasse narrativo e algum pretensiosismo na concepção: SubUrbia. E admiro o Linklater.
Ainda bem que falaste de L.I.e, belo filme do estreatante Michael Cuesta- GRANDE Brian Cox. Os outros dispensam adjectivos ou qualquer tipo de promoção: Elephant, uma obra-prima, e Donnie Darko uma das melhores primeiras obras desta década.
Parabéns pela critica
cumprimentos
sOlo: Vá, não sejas tendencioso...A "tua musa" até tem uma presença reduzida, não se evidencia muito...Bons filmes.
Luís Mendonça: Sim, o look é o de uma BD indie, mas não creio que isso prejudique o filme. Não adorei "SubUrbia", mas tem uma estrutura narrativa interessante e consegue captar eficazmente a "teen angst". E o "L.I.E." não merecia ter passado tão despercebido, é uma óptima primeira-obra. Obrigado :)
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