terça-feira, abril 19, 2005

Esquece Tudo o Que Te Disse

Título Original:
"Esquece Tudo o Que Te Disse" (2002)

Realização:
António Ferreira

Argumento:
César Santos Silva & António Ferreira.

Actores:
António Capello – Messias
Custódia Gallego – Felizbela
Amélia Coroa - Barbara
Fernando Taborda – Tobias



Realizado por António Ferreira, a acção de Esquece Tudo o Que Te Disse gira em torno de uma daquelas famílias fora de prazo, e das relações que se criam e dissolvem entre eles à medida que o filme se desenrola. Neste contexto é nos apresentado Messias, o pai dentista e aprendiz de ilusionista que sente que o seu casamento vive a gota de água a qualquer momento; Felizbela, uma esposa neurótica que bebe e fuma compulsivamente de modo a esquecer o amor e ciúme que sente pelo marido; Joana, a filha adulta que é adolescente a tempo inteiro; Pankas, o tradicional rebelde sem motivo que namora a filha; Tobias, o avô pastor que vive encarcerado na casa da família; Celeste, a empregada assediada pelo avô; Bárbara, a enigmática sobrinha com queda pela piromania que vai passar uns dias com a família; e por fim um bode que é constantemente confundido com uma cabra, e cuja presença torna-se hilária em certas situações.
Todas elas são personagens cativantes à sua maneira, e de certo modo cada um representa um estereótipo de português. Porém são as interpretações de António Capello e Custódia Gallego que conduzem magnificamente o filme a bom porto, através das personagens Messias e Felizbela, cujas interpretações ímpares enriquecem muito o filme, especialmente a de Custódia, cuja escolha para viver esta personagem revelou-se uma surpresa mais que agradável, e que mete Annette Bening a um canto com a sua personagem em Beleza Americana. E faço esta comparação porque de certo modo existem parecenças entre os dois filmes, nomeadamente no contexto da família em colapso, e da caracterização das personagens. Semelhanças que ocorrem em realidades diferentes, mas cuja analogia não pode ser evitada.

Porém, a única falha do filme, a meu ver, encontra-se no percurso da personagem Bárbara. A sua inserção na história leva a querer que esta é uma peça fundamental, mas o filme funcionaria bem sem ela. Entende-se a sua revolta para com o mundo e o seu ódio pela felicidade alheia, mas não se compreende as suas pancadas para com aquela família. Assim como se uma parte do filme tivesse sido perdida, o espectador fica sem saber o motivo da fascinação de Barbara por Messias, e a antipatia pelos restantes. Um ponto a menos nesta quase obra-prima nacional.

No que diz respeito a questões técnicas, Esquece Tudo o Que Te Disse tem uma fotografia fabulosa, com um domínio de cores e sombras magnífico. Os cenários esses, embora não sejam tipicamente lusitanos, a sua componente de habitação e local da história até são convincentes (a acção decorre maioritariamente numa casa indefinida com o mar de um lado e um pinhal do outro), a atmosfera em que o filme vive torna fiel o interesse do espectador, e o guarda-roupa até que não roça o ridículo que há em produções nacionais, especialmente o de Felizbela, que lhe transmite plenamente toda a altivez e soberba que a personagem tem.
Quanto à banda sonora, Esquece Tudo o Que Te Disse até tem músicas curiosas. Num país cuja música dos filmes pouco ou nada importa, temos aqui o tema homónimo interpretado pela personagem Felizbela, além de uma versão punk do Fungágá da Bicharada cantada por Pankas, e curiosamente um cameo de David Fonseca numa cena de Karaoke, onde interpreta amadoramente o hino Borrow.

Apesar de possuir alguns dos clichés a que os filmes nacionais já nos habituaram, este é sinceramente um dos melhores filmes portugueses que já vi. É certo que fica aquém de ser uma obra de arte, mas a verdade é que o filme tem uma história que até funciona, uma dinâmica que prende o espectador, e uma realização fantástica a quem se deve tirar o chapéu.
Se o cinema nacional pode ser sinónimo de entretenimento em vez de tédio, então este filme é o exemplo perfeito disso. E como é não é todos os dias que o cinema português nos dá uma pérola assim, é com prazer que aconselho a verem Esquece Tudo o Que Te Disse.

® Fábio Guerreiro

2 Comments:

At 9:00 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Olá Fábio!

Obrigada pelo comentário no Port Moresby.
Gostei muito da tua crítica e concordo quando te referes ao filme como uma "quase obra-prima nacional". A Custódia Gallego foi, para mim, uma autêntica revelação (os outros trabalhos que vi dela mostravam-me apenas uma actriz mediana).
Também concordo com a tua opinião em relação à personagem Bárbara e ao seu (por vezes mal definido) papel na acção.
A banda sonora é muito boa. Ando com a música que a Felizbela canta no filme a ecoar-me na cabeça desde que o vi.

 
At 1:18 da manhã, Anonymous Anónimo said...

não acho que seja quase uma obra-prima nacional, mas gostei do filme. É um filme com duas interpretações assinaláveis: a daCustódia Galego, como foi mencionado pela Vera, e a de António Capelo.
É uma primeira longa-metragem promissora do António Ferreira, que já se tinha destacado numa curta metragem magnífica: "Respirar Debaixo D´Água".

cumprimentos

 

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