quarta-feira, março 23, 2005

Aparelho Voador a Baixa Altitude

Título Original:
"Aparelho Voador a Baixa Altitude" (2001)

Realização:
Solveig Nordlund

Argumento:
Solveig Nordlund, Colin Tucker & Jeanne Waltz

Actores:
Margarida Marinho - Judite
Miguel Guilherme - André


Num futuro longínquo e incerto, a raça humana está próxima do fim. Cartazes espalhados por todo lado mostrando uma criança sorridente, com a frase "Acreditamos no Futuro", mostram o optimismo num mundo melhor e na crença de que os humanos continuarão a sobreviver mesmo num mundo decadente, silencioso e quase desértico.

É este cenário que nos propõe Solveig Nordlund no filme Aparelho Voador a Baixa Altitude, uma co-produção entre Portugal e Suécia, estreada nos nossos ecrãs, quase despercebida, em 2001. Solveig adaptou uma série de contos de J.G. Ballard, autor de romances já levados ao cinema, como o “Império do Sol” ou “Crash”. Numa das raras incursões do cinema português na ficção científica, Solveig abdicou dos efeitos especiais e cenários estereotipadamente futuristas. Optou, ao invés disso, por mostrar um mundo palpável, material, que todos conhecemos. As imagens seleccionadas, o silêncio que as acompanha, e a excelente fotografia do filme, contribuem para nos sentirmos mais próximos deste futuro e dando assim uma maior densidade psicológica.

A raça humana está em perigo. As mulheres, devido às diversas alterações e manipulações genéticas, têm dificuldade em dar à luz crianças saudáveis. Os Z.O.T.E., seres geneticamente alterados, com forma humana mas sem visão, apenas sensíveis a cores fluorescentes, nascem em lugar dos humanos. O governo obriga todas as mulheres grávidas a fazer um exame como medida de prevenção, e caso seja detectado um Z.O.T.E. em gestação, o aborto torna-se automaticamente obrigatório.
É neste contexto que surge um casal, interpretado por Margarida Marinho e Miguel Guilherme. Esperam o primeiro filho após inúmeras tentativas. O desejo de não abortar, mesmo que o filho não seja humano, é um dos objectivos de ambos. Fugindo ao exame obrigatório, o casal foge e refugia-se numa estância balnear quase abandonada. Aqui surgem estranhas personagens que passam a fazer parte do quotidiano deste casal. Um grupo de idosas tenta a todo o custo engravidar, e o médico da estância passa grande parte do tempo a sobrevoar o hotel e a praia num aparelho voador. Um ser estranho, que poderá ser um Z.O.T.E., circula pelos corredores do hotel, com o consentimento e aceitação de todos.

Com o desenvolvimento do filme apercebemo-nos que se trata, mais do que uma visão num futuro incerto e decadente, de uma parábola sobre a condição humana. O mundo está alterado, mas fará sentido eliminar os novos seres que nascem, eles próprios “fabricados” pela ambição desmedida do homem? Não terão de fazer parte do futuro? E o papel de mãe, das mulheres que dão à luz esses seres?

Temos assim um filme que importa descobrir por vários motivos. A sua ausência das vendas directas em DVD ou mesmo VHS é um dos grandes mistérios das editoras em Portugal.

® André Mantas

3 Comments:

At 11:36 da tarde, Blogger Amarië Lúinwë said...

Fui ver este filme um pouco renitente, pois o cinema português nunca me tinha cativado. Mas este filme é totalmente diferente e provocou uma mudança, no sentido que me fez querer procurar mais, bom cinema português.
O argumento é execelente e de uma poesia enorme, tanto pela sua fotografia como pela sua cor.
O desempenho da actriz principal também é algo de memorável e extraórdinário.
Não é fácil promover, fazer, ajudar cinema português. Existem poucos recursos e os apoios (o ICAM é o principal) não chegam para todos aqueles que querem fazer cinema.
Também é muito grave o facto do filme não ter ido para venda (quer em vhs quer em dvd) pois assim fica uma obra parada, o que é uma pena!
Faço uma vénia a este bom filme e a outros tantos bons filmes portugueses!

 
At 2:13 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Acabei de ver este filme na RTP2. Como não o vi desde o início, não tinha percebido bem o que se passou, mas agora que li este texto já o entendo melhor..
O filme é muito alternativo. Não tem nada a ver com o que estamos habituados ver na TV ou no cinema. Pareceu-me que muito mais de metade do filme foi silêncio. Mesmo assim, ou talvez por causa disso, adorei-o.
Como já disse Amarië Lúinwë, o desempenho da Margarida Marinho foi espectacular. Eu sofri mesmo com ela, principalmente na cena em que se atira ao mar para lavar a barriga. A indifrença dos outros hóspedes ao que acontece à volta deles (Judite a afogar-se... Judite embriagada em cima da mesa...) é simplesmente perturbante e o facto daquelas velhas quererem engravidar é hilariante.
Tendo em conta como acabou o filme, não me parece que o bebé de Judite seja "perfeito", ou percebi mal? Se fosse, não o teria levado?
Enfim... eu gostei do filme, gostei dos momentos em que só se via uma imagem... mas claro que também achei algumas cenas bastante esquesitas. Mesmo assim, acho que vale a pena ver o filme :).

 
At 8:07 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Também vi ontem este filme na RTP2 e achei muito interessante, quer a nivel de argumento, quer em termos de composição de imagem.

Um bom filme portugues!
Daniela Borralho

 

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