quinta-feira, junho 09, 2005

O Jogo

Título Original:
"The Game" (1997)

Realização:
David Fincher

Argumento:
John Brancato & Michael Ferris

Actores:
Michael Douglas- Nicholas Van Orton
Sean Penn- Conrad Van Orton
Deborah Kara Unger- Christine


A minha relação com este O Jogo é deveras insólita e digo-o com agrado. O primeiro visionamento(há já muitos anos), que neste filme é eterno por razões óbvias, deu-me a conhecer a espectacularidade surpreendente da obra e pouco mais. O que acontece é que quando o revi há muitos meses, descobri o incrível humanismo que se sobrepôs às qualidades referidas anteriormente. Como é que um filme com uma premissa tão tensamente activa consegue ser tão profundamente humano? Bem, David Fincher é um dos exemplos máximos do “savoir-faire”. Não precisa do mediatismo de Tarantino nem da consagração de Soderbergh pela Academia(muito menos isso). Em talento não deve nada a ninguém.

Esta é uma premissa enigmaticamente inquietante. Nicholas Van Orton(soberbo Michael Douglas) é um especulador financeiro possuidor de um capital altamente milionário. Nicholas é muito decente, sim, mas a sua monótona vida é um autêntico espelho de misantropia e taciturnidade. Desencantado e algo indiferente com tudo, tirando o trabalho, Nicholas, tal como multidões, é alguém a quem falta. Aquilo(seja lá o que isso for). O seu desvairado e problemático irmão(belíssimo Sean Penn) aparece-lhe no seu dia de aniversário, passado na solidão, disposto a lhe mudar o condenável corrente rumo da sua vida. Oferece-lhe o contacto de uma empresa que proporciona uma intensa experiência de vida. As consequências devastadoras que a vida de Nicholas sofre, provam-lhe que bem pode ter-se metido na boca do diabo.

Porquê diminuir O Jogo à vista da excelência e do impacto influenciável no mundo cinematográfico de Sete Pecados Mortais ou ao fenomenal culto gerado à volta do fenomenal Clube de Combate? Dê-se crédito sejam a quais forem as opiniões à volta deste trio de platina, como alguém muito bem disse uma vez, é do mais legítimo poder juntar estas três obras definindo-as como a “santíssima trindade” de Fincher.

Começa lindamente. A cena inicial indicia que este será um filme mais preocupado numa abordagem de dimensões compassivas e mais despreocupado com os tops. A fotografia com tons sombrios espelha o mistério angustiante e hipnótico e também desencantado próprio da natureza da obra, complementada com a excelência da, sem com grande aparato, banda sonora de Howard Shore, Os oportunos flashbacks da infância de Nicholas, dão maior consistência à terrível vulnerabilidade sentimental deste, assombrados pelo fantasma do seu tragicamente falecido pai. É retratada de forma mais que exemplar a sua constante ausência da vida social, a sua quase desistência de dar lugar à vivência por troca da sobrevivência, acabando por lhe provocar uma constante onda de mal-estar depressivo, muitas vezes justificada com o descontrolo emocional e a desvalorização dos valores humanos para com o Mundo, sendo este o causador deste frémito todo. E não há que esperar que nos apareça um Desafio para nos salvar ou condenar. Há que ir à luta.

Um dos filmes máximos dos anos 90.

® Artur Almeida