domingo, setembro 02, 2007

Bug

Título Original:
"Bug" (2006)

Realização:
William Friedkin

Argumento:
Tracy Letts

Actores:
Ashley Judd - Agnes White
Michael Shannon - Peter Evans
Harry Connick Jr. - Jerry Goss
Brian F. O'Byrne - Dr. Sweet

“O nome de William Friedkin ficará para sempre associado à comédia grosseira, devido a O Exorcista, por muitos confundido como um dos maiores exponentes do cinema de terror do século XX. Tal equívoco deveu-se ao título, à música de Mike Oldfield e a uma cena de vómito verde e cabeça rotativa (agora, quem viu a versão unrated, em que a estátua do Demónio tinha um falo erecto esculpido em pedra...) mas, se confusão havia, a mesma passou para Bug, um patético e risível estudo sobre a paranóia e a esquizofrenia.

Baseado na peça de teatro de Tracy Letts, Bug é filmado como se um espectador tivesse subido ao palco e acompanhasse os actores, dirigindo a câmara para quem vai falando ou entra em cena, com a inexactidão de quem ainda não está familiarizado com a peça e não sabe ao que deve dar relevância. Os actores, nesse desconcerto, rapidamente se tornam cabotinos, registo comum em teatro, mas uma adaptação cinematográfica pede uma abordagem diferente, exige um intimismo e uma densidade aos quais o realizador não pode ser alheio. Friedkin não viu assim o assunto.

Bug até começa de forma promissora, construindo algum suspense com aquilo que desconhecemos. Os dois protagonistas conhecem-se e engraçam um com o outro. Ela é empregada num bar de lésbicas e tem uma relação homossexual com uma colega, vive com medo do ex-marido que acabou de sair da cadeia e recebe telefonemas atrás de telefonemas de alguém que não diz nada; ele é um ex-militar que passou algum tempo num hospital psiquiátrico, diz ele que para se tratar de uma droga experimental que lhe injectaram no corpo enquanto estava no Iraque. O surgimento desta figura tímida e simpática, ainda que neurótica, associada ao regresso do violento ex-marido, vão despoletar uma demência a dois que não se engole nem por um instante, muito menos o facto de ela aderir tão facilmente à paranóia dele de ter insectos a viver dentro e fora do corpo. Sem maior preparação, é inconcebível que uma mulher dada como terra-a-terra e inteligente se deixe iludir pela loucura de um estranho, por muito solitária que esteja ou necessitada de contacto físico com um homem (teria de ser algo mais gradual, mas isso obrigaria a menos desleixo e maior coerência, e nem Letts nem Friedkin estiveram para tanto).

Por alguma razão, Ashley Judd insiste nos papeis de mulher brutalizada e corajosa, mas o seu despojamento físico (incluindo nudez integral) e dramático não a comprometem, antes munindo o personagem de uma integridade inesperada. Michael Shannon fizera parte do elenco original britânico da peça e mantivera o papel em Nova Iorque, pelo que a passagem para o cinema se deu sem sobressaltos (a sua dicção é que continua entredentes e incompreensível). Harry Cornick Jr. representa o ex-marido, mas não faz mais do que caretas e um sotaque campónio.

O realizador William Friedkin transformou-se num tarefeiro sem memória, ao fim de três decadas passadas entre fracassos televisivos e cinematográficos, mas temos de lhe tirar o chapéu a Os Incorruptíveis Contra a Droga e Viver e Morrer em Los Angeles, obras cruciais do cinema policial americano, equiparáveis aos de cineastas como John Frankenheimer ou Michael Mann.

Bug perde-se nos seus próprios tiques, baloiçando entre a história de amor, o melodrama e o filme de terror, mas sem a menor credibilidade ou contacto com o público, e terminando num terceiro acto sangrento e inútil, como se a única forma de acabar semelhante enrascada fosse queimar tudo.

® Ricardo Lopes Moura

3 Comments:

At 5:51 da tarde, Blogger Cataclismo Cerebral said...

Não concordo nada com a tua crítica. Eu cá continuo a achar que se trata de uma fascinante abordagem ao poder da persuasão, tendo em conta as personalidades à deriva daquelas 2 pessoas. A influência teatral está lá toda, mas não compromete as qualidades cinematográficas que o filme exala. Depois conta com uma entrega e composição fascinante da Ashley Judd, que volta a provar a excelente actriz que é.

Abraço

 
At 11:35 da manhã, Blogger Flávio said...

Pois, eu acho que também discordo do Ricardo. Gostei que o realizador tivesse mantido a unidade de lugar ao longo de todo o filme. Se acham que é fácil, tentem escrever um filme de duas horas inteiramente passado no interior de uma cabana.

Outra questão: não acharam a história dos afídeos muito idêntica ao início do Scanner Darkly do Philip K. Dick? (Não que isso desmereça o filme, não tenho nada contra os plágios desde que sejam bem feitos)

 
At 1:51 da manhã, Anonymous Anónimo said...

acho que a tua critica tambem nao faz muito sentido!

Existem provas mais que dadas no filme que a personagem que Ashley Judd dá vida é uma mulher tambem ela À deriva, com uso de drogas, uma mulher desiquilibrada que facilmente se deixaria enredar pela teoria!

Acho o filme magistral na forma como se vai desenvolvendo...

 

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