domingo, outubro 21, 2007

A Estranha em Mim

Título Original:
"The Brave One" (2007)

Realização:
Neil Jordan

Argumento:
Roderick Taylor & Bruce A. Taylor

Actores:
Jodie Foster - Erica Bain
Terrence Howard - Detective Mercer
Naveen Andrews - David Kirmani
Mary Steenburgen - Carol


Erica Bain (Jodie Foster) percorre ruas sem fim para conseguir escutar os sons da cidade de Nova Iorque e transformá-los em palavras que exprimem sensações e sentimentos e sensações do dia-a-dia das pessoas. É esta sua capacidade inata de criar histórias através dos sons que faz do seu programa de rádio “Street Walk” um sucesso.

Prestes a casar com David Kirmani (Naveen Andrews, conhecido pela série “Perdidos”), Erica atravessa a fase mais feliz da sua vida, sentindo-se realizada a nível pessoal e profissional. Só que um passeio nocturno destrói tudo isso. Sem motivo aparente, um grupo de criminosos espanca violentamente Erica e acaba por matar David.

Após uma dolorosa recuperação, Erica descobre uma estranha em si. Teme andar nas ruas por onde sempre passava, sendo consumida pelo medo. E como o medo e o desejo de vingança são os piores aliados, Erica compra uma arma, supostamente para se sentir segura, mas a estranha em si acaba por tomar conta dela e dá-lhe a coragem de se livrar de quem a possa atacar e a frieza de disparar contra esse alguém.

Á noite Erica Bain transforma-se numa “vigilante” que faz justiça pelas suas próprias mãos, sem deixar pistas para a polícia. O detective Mercer (Terrence Howard), encarregado da investigação dos homicídios da “vigilante”, ironicamente acaba por tornar-se amigo da autora do seu programa de rádio preferido, sem suspeitar do que ela fez.

Neste filme encontramos uma Jodie Foster com o seu eterno rosto de menina marcado pela passagem do tempo, mas que a nível de interpretação tem sempre muito a dar, o que a faz ser uma das melhores actrizes americanas.

É graças a Jodie Foster que este filme de Neil Jordan ganha boa parte do seu interesse. A relação com o detective Mercer, personagem que podia ter sido mais explorada, é uma estranha amizade, deixando no ar a possibilidade de uma maior aproximação. A meio o filme perde um pouco de fôlego e desaba com um final disparatado. “A Estranha em Mim” podia ter ido mais longe, mas como não foi, ficamos com uma espécie de partitura inacabada.

® Isabel Fernandes

4 Comments:

At 4:32 da tarde, Blogger Cataclismo Cerebral said...

Concordo com a tua crítica, excepto quando dizes um final disparatado. Um dos melhores do ano, quanto a mim.

 
At 1:15 da tarde, Anonymous Anónimo said...

A ESTRANHA EM MIM (THE BRAVE ONE)
9*/10*

Depois do sui-generis mas profundo “Breakfast in Pluto”, Neil Jordan traz-nos em 2007 um objecto cinematográfico que, como todos os seus outros filmes, não é de culto, mas cujo impacto é maior do que se fazia prever. De novo e em grande escala, o triunfo da transposição de emoções para a tela.


Com o seu namorado, David (Naveen Andrews, celebrizado na séria “Perdidos”), Erica, uma locutora de rádio nova-iorquina, vivia um idílio quase perfeito. À beira do casamento, os dois são subitamente afastados pela crueldade de uma noite em que a violência urbana triunfa: depois de um assalto num vulgar passeio com o cão, os dois são assaltados e ele é espancado até à morte; ela fica em coma mas consegue sobreviver.
“The Brave One” é Jodie Foster, a corajosa Erica Bain renascida que, fora de si e ao encontro de um alter-ego exaltado por acontecimentos traumáticos, se torna uma justiceira silenciosa e obcecada pelo regresso ao que sabe que nunca poderá voltar a ser – alguém leve, feliz com a profissão e a vida na sombra da cidade mais segura que é também a mais perigosa de todas. De uma narradora que usava a voz para transmitir aos ouvintes a estranheza e anonimato da cidade, enquanto “caminhante”, mas colocando sempre ênfase num certo fascínio pela sua Nova Iorque, ela passa a tomar nas suas próprias mãos a execução da justiça que inclusive a polícia – incorporada no detective Mercer (Terrence Howard)- sabe não existir na realidade. O “alguém” torna-se “ninguém”, protector dos fracos e oprimidos, que ao confrontar-se a si próprio com o sofrimento obriga também os outros a perceberem qual a dimensão de fazer mal aos outros – olho por olho, dente por dente.

“A Estranha em Mim” (título em português) é, além de um filme poderosamente emotivo (sem ser lamechas) e adequadamente violento, uma obra em que Jodie Foster sai mais uma vez reforçada enquanto actriz de talento imortal. Erica Bain é um monumento virtuoso aos personagens dramáticos, que escapa aos clichés habituais do género – as suas lágrimas são mais internas do que externas, a sua fragilidade é igualmente uma força masculina impressionante, que se revela exactamente quando tem que se revelar. Quase acreditamos que só ela poderia desempenhar este papel, assim como se entra a fundo na atmosfera sombria - e que se anuncia kármica e pesada desde o começo- e se sai dela duvidando que os argumentistas (Roderick e Bruce A. Taylor) ou o realizador não tenham passado por aquela mesma experiência, tal é a veracidade da sua condução da história.
Neil Jordan consegue em vários momentos fugir ao óbvio (por exemplo na relação entre Erica e Mercer, uma amizade especial cheia de essência que fica em aberto) e não recorre demasiado aos mesmos artifícios – o flash-back e a sobreposição de momentos passados e presentes aparecem na devida altura, a violência de algumas cenas é poupada ao razoável e exaltada quando necessário. Quanto ao final, nele se consolida a virtude da obra vista, bem como o crédito importantíssimo de Terrence Howard (“Colisão”), que apesar de não se encontrar muito longe de papéis anteriores mostra mais uma vez a habilidade do meio-termo entre a emoção e a dureza, representando uma humanidade comovedora e surpreendente nos dilemas do seu personagem entre o dever e a justiça real.
“A Estranha em Mim” não é, em suma, um filme fácil de digerir, mas sem dúvida que perdura na memória – pela qualidade e conteúdo das interpretações, pela quase perfeição do ritmo –o desenrolar da história não é apressado nem vagaroso em excesso-, pelo medo que nos incute de que, um dia, a história de Erica Bain possa ser também a nossa. E pela força com que os seus passos errantes penetram nas nossas emoções, ao estilo de um belo soco no estômago.

 
At 2:03 da manhã, Blogger Flávio said...

«A meio o filme perde um pouco de fôlego e desaba com um final disparatado.»

Assino por baixo e discordo do comentário do Cataclismo Cerebral. O final é completamente inverosímil e rebuscado e sou capaz de apostar que foi imposto ao realizador Neil Jordan pelos produtores americanos, sempre obcecados com os finais felizes. Como já comentei no blogue do Lauro António, o final ideal seria a detenção da Jodie Foster pelo detective, seguida da demissão deste.

 
At 10:20 da tarde, Blogger Lord of Erewhon said...

Pelos vistos o diálogo subliminar que a película estabelece com «Taxi Driver» passou-te ao lado...

Além da questão política... mas isso é outra conversa.

 

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