Alexandre, o Grande
Título Original: "Alexander" (2004) Realização: Oliver Stone Argumento: Oliver Stone, Christopher Kyle & Laeta Kalogridis Actores: Collin Farrel - Alexandre Angelina Jolie - Olympias Val Kilmer - Filipe da Macedónia Anthony Hopkins - Ptolomeu |
Controverso, intenso, arrebatador. O filho desejado de Oliver Stone saíu do armário, para o pódium de melhor épico de 2004 e, certamente, um dos melhores filmes de sempre.
Guardado ao longo de anos a fio, à espera de financiamento milionário e de um rasgo de coragem para devolver o estilo épico a Hollywood, Alexandre, o Grande estreou nas salas portuguesas em 2004, e, tal como um pouco por todo o mundo, não passou indiferente. As críticas negativas foram devastadoras, num filme que, sem dúvida, se ama ou se odeia: no meu caso, perdoem-me, fico-me pela primeira hipótese. Não sei se os factos lá descritos são verdadeiros ou falsos (lamento não conhecer bem a vida de tão nobre figura), mas, senhores, cinema é ficção, e Oliver Stone soube fazer deste filme monumental uma grande e belíssima ficção.
Colin Farrell, o “bad sexy boy”, esteve perto da perfeição nesta interpretação de um Alexandre justo e perturbado, nobre e feroz, grande comandante militar e companheiro do seu exército mas, simultaneamente, perseguido pelos seus fantasmas de infância (a figura de um pai castrador mas ao mesmo tempo idolatrado, e de uma mãe venenosa mas apaixonada pelo filho, por ele amada e odiada). Vítima dos seus fantasmas e da sua indefinição, incompreendido por muitos – inclusive pelos seus soldados -, o Alexandre de Stone é um ser humano “castigado por ser belo e poderoso” (assim lho diz a certa altura Filipe da Macedónia, seu pai, interpretado por um Val Kilmer que evoca os seus tempos dionisíacos em The Doors - o Mito de uma Geração. Demasiado fragilizado pelos seus afectos e pelas suas escolhas, que tem de fazer desde cedo, obcecado pelo fantasma do pai morto e pela sombra da mãe, Olympia (que assenta muito bem na diabólica Angelina Jolie, aparte a pouca diferença de idades entre mãe e filho na película), Alexandre é visto por Ptolomeu (Anthony Hopkins), seu antigo general, não como um homem mas como um “colosso”, notando-se aqui uma admiração que pode muito bem vir do criador do filme.
Ao longo de três horas de sangue, suor e lágrimas, literalmente, o espectador é confrontado com uma obra cinematográfica que mostra bem o que custou, mas que revela acima de tudo uma narrativa, caracterização e fotografia riquíssimas, onde não faltam as referências ao mítico Platoon, do mesmo realizador (como a impressionante cena final da batalha travada na Índia contra os Persas, com Alexandre mergulhado em sombras vermelhas depois da queda do seu Bucéfalo e da sua própria, pela primeira vez ao longo de anos de conquistas sucessivas, em que nada parecia detê-lo). O trabalho de filmagem é trepidante nas cenas de batalhas e os efeitos visuais poderosíssimos, ou não fosse termos aqui uma junção do conhecido equilíbrio grego com a extravagância e as cores orientais, onde não falta uma recriação dos jardins suspensos da Babilónia.
Além de tudo isto, Stone soube ser original e não criar mais um épico dominado por cenas de batalha cansativas: pelo contrário, o polémico realizador partiu da outra face dos acontecimentos, ou seja, do lado interior dos personagens e das suas relações - o que, ironicamente, criou a maior de todas as polémicas. Inevitavelmente a mencionar, aqui, a relação do líder macedónio com Hefaísto (Jared Leto), que, ao contrário do que muitos dizem, não domina o filme, e é até bastante subtil na sua representação no grande ecrã (nota-se apenas entre os dois um carinho e uma cumplicidade grandes, bem retratados de forma quase poética, como se houvesse uma certa preocupação em não chocar demasiado).
Em suma, Alexandre, o Grande é um filme apaixonante pela sua profundidade, inovador na tradição stoniana (é o primeiro épico do realizador, que usualmente prefere apostar em símbolos americanos contemporâneos para protagonizar os seus trabalhos, sejam eles pessoas ou acontecimentos) e no género em geral, em que apenas pequenos pormenores ou o facto de querer compilar 32 anos de uma vida excessivamente cheia em 3 horas podem abonar contra um grande exemplo de um excelente argumento. A não convencionalidade deste, aliás, encerra a raíz de todos os amores e ódios que tem despoletado, bem como a apresentação narrativa nem sempre linear em termos temporais – Stone faz questão de nos colocar logo na realidade ao início, colocando Ptolomeu a falar de Alexandre, já falecido, aos seus alunos, e focando isso pelo meio do filme, mesmo quando talvez não fosse necessário e se torne até dissuasor do envolvimento do público na história, muito embora se assemelhe a uma fracção de documentário histórico (como se os alunos pudéssemos ser nós, espectadores, a aprender sobre o carismático líder). É essa mistura de géneros que pode constituir um senão no filme, tal como um estranho sotaque de Olympia (Angelina Jolie) que não se percebe de onde vem; de resto, a beleza filosófica e, simultaneamente, tão carnal de Alexandre, o Grande juntam-se à extraordinária prestação do protagonista para formar um conjunto poucas vezes visto no cinema. E, será mesmo verdade que "a sorte sorri aos audazes?", como acreditava Virgílio?
® Andreia Monteiro
5 Comments:
Foi a melhor nota que já vi alguém dar a este filme. Não posso comentar porque ainda não vi, mas as expectativas não estão muito elevadas.
Beijos
Andreia, desculpa mas não concordo nem um pouco com a tua análise. Para além das inúmeras incorrecções históricas, a realização é fraca (montagem, argumento, etc), as cenas de batalha não são nada de especial e Colin Farrel não tem o minimo de carisma de líder. Já para não falar na insinuação gay que é apresentada durante toda a película entre Farrel e Jared Leto. Eu só pergunto uma coisa: Oliver Stone quer que nos lembremos de Alexandre, o inseguro, homossexual, fágil..ou Alexandre o Grande? Não me parece grande coisa este filme... Cumprimentos,
Sérgio lopes.
Sérgio:
as grandes figuras podem ser frágeis, homossexuais e por vezes inseguras..não concordas? Ou será que os heróis são sempre como os vemos no cinema, heterossexuais, viris, intocáveis e de personalidade bem definida? Já contava com opiniões como a tua, e só tenho que as respeitar. O que exprimo, como admiradora do género épico e de Oliver Stone, é admiração por um filme que não se limitou às matrizes dos épicos que vimos até hoje: com as batalhas da praxe a comandarem a acção dramática. Gostei de Farrell no papel porque deu justamente força a um personagem perturbado, e foi isso que mais me atraiu no filme, admito: Stone não se deixou seduzir pelo que toda a gente já sabia ou supunha, mas pelo lado obscuro do Grande Homem. Verdade ou não? Não sei, confesso, mas agrada-me esta visão imperfeita do herói. Cumprimentos!
Andreia:
Aceito e respeito obviamente a tua opinião. Mas não me convence que um Alexandre, retratado da forma que foi por Oliver Stone seja capaz de ser um grande conquistador. Reitero as fraquezas que detectei no meu anterior comentário dizendo que, para mim, foi uma das maiores desilusões a nivel de filmes épicos. Oliver Stone é capaz do melhor e do pior. Incrível!
Nota: Continuação de boas análise, pois escreves muitíssimo bem...!
Cumprimentos,
Sérgio Lopes.
Crítica à parte, e realmente a tua está muito boa, como sempre, o filme não me convenceu. Achei a escolha dos actores desastrosa, Colin Farrel não esteve à altura de tão grande figura da história, falta-lhe o carisma que tem, por exemplo, um Mel Gibson, para um filme desta envergadura. Basta pensar em Braveheart. Angelina Jolie estava também péssima, irritante do primeiro ao último minuto, com um sotaque ridículo e por vezes risível. Não vou sequer entrar pelo Val Kilmer, que quanto a mim já devia estar morto e enterrado para o cinema. (Só mesmo Kiss Kiss Bang Bang o pode salvar)
Ao filme em si faltou-lhe grandiosidade, artística e técnica. Um grande épico, quanto a mim, oco, sem conteúdo visível numa figura tão cheia de força. Oliver Stone esteve um desastre na realização, demasiado fragmentada.
Não posso portanto concordar contigo. Foi, para mim, um desastre a todos os níveis.
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