quarta-feira, julho 25, 2007

As Bandeiras dos Nossos Pais

Título Original:
"Flags of our Fathers" (2006)

Realização:
Clint Eastwood

Argumento:
William Broyles Jr. & Paul Haggis

Actores:
Ryan Phillippe - John "Doc" Bradley
Jesse Bradford - Rene Gagnon
Adam Beach - Ira Hayes
John Benjamin Hickey - Keyes Beach
John Slattery - Bud Gerber


Depois de uma obra intimista como Million Dollar Baby - Sonhos Vencidos, o regresso de Clint Eastwood à realização surge através de um projecto mais ambicioso, o díptico As Bandeiras dos Nossos Pais e Cartas de Iwo Jima, dois filmes que se complementam uma vez que focam a mesma temática, embora com pontos de vista distintos.

O primeiro, que estreia esta semana, centra-se nos soldados americanos que invadiram Iwo Jima, uma ilha do Pacífico que se tornou num dos pontos estratégicos durante a II Guerra Mundial. O segundo, com chegada às salas prevista para Fevereiro, segue as experiências da facção japonesa, que lutou pela conquista do mesmo território.

Mais do que focar essa batalha, o filme lança um olhar sobre o impacto que a sua imagem mais emblemática gerou, a de uma foto com seis soldados americanos a empunhar a bandeira num cume de Iwo Jima. Tendo por base dados verídicos, Eastwood elabora uma ficção que se concentra nas peripécias e reacções que marcaram três dos soldados, tanto no palco da guerra como, posteriormente, nos das diversas palestras que deram por todo o país enquanto heróis sobrevivente de um conflito trágico.

Esse heroísmo é, no entanto, posto em causa ao longo da acção, contrariando as ovações do público que acolhe o trio com euforia, ânimo e elevada estima, aderindo em massa a uma operação de propaganda que visa recolher fundos para o exército.

Os três jovens jovens, relutantes em aderirem às luzes mediáticas, acabam por lidar com estas de várias formas: o socorrista John "Doc" Bradley mantém uma postura discreta e reservada, recordando com angústia alguns colegas que perdeu; Rene Gagnon vai aceitando progressivamente o alvo de atenção em que se torna, muito por culpa da sua namorada, hipnotizada pelos holofotes; e Ira Hayes, que desde o início se mostrou menos cooperante com a digressão patriótica, acaba por se refugiar no álcool e mergulhar numa conduta cada vez mais descontrolada, não só pelas memórias que o traumatizaram mas pelo racismo de que é alvo, por detrás das câmaras, devido à sua acendência índia.

Se é certo que o anti-americanismo se tornou moda em alguns meios, Eastwood recusa esse posicionamento fácil, mas também não transforma o filme num objecto glorificador das proezas dos EUA, antes numa obra desencantada e ambígua que expõe a complexidade humana e evita maniqueísmos tendenciosos.

Esse equilíbrio e inteligência não basta, contudo, para que As Bandeiras dos Nossos Pais ascenda à categoria dos filmes indispensáveis, já que sofre de alguns problemas de ritmo, de um argumento demasiado fragmentado (os recorrentes flashbacks nem sempre são oportunos), de um desenvolvivento das personagens que fica aquém das expectativas e de uma escassa capacidade de demarcar um espaço próprio, apresentando uma perspectiva sóbria e perspicaz mas não explorando territórios especialmente inovadores.

À medida que as suas excessivas duas horas de duração vão decorrendo, adensa-se um efeito de repetição que faz desta uma obra algo genérica, embora raramente dê passos em falso. Tecnicamente é mesmo uma película sem reparos, com sequências de grande intensidade visual servidas pela impressionante fotografia de Tom Stern ou pela realização ágil de Eastwood, que nas cenas bélicas chega a lembrar O Resgate do Soldado Ryan, de Steven Spielberg (não por acaso, co-produtor do filme) ou a série televisiva Irmãos de Armas, dadas as cargas de um realismo cru e visceral.

Do elenco, destacam-se Ryan Phillippe, com uma contenção e vibração já presentes em Colisão, de Paul Haggis (que aqui é um dos argumentistas), confirmando-o como um actor a seguir, e Adam Beach, que encarna um Ira Hayes apropriadamente tenso e irriquieto. Barry Pepper e Jamie Bell contribuem para enriquecer a ficha técnica, mas as suas capacidades são subaproveitadas pela secundarização das personagens que interpretam.

Mais ambicioso do que conseguido, As Bandeiras dos Nossos Pais é ainda assim uma obra com méritos que justificam a sua descoberta, mas não deixa de ser algo desapontante tendo em conta que havia aqui, tanto pelo tema como pelos nomes envolvidos, substrato para alcançar resultados de maior brilhantismo. Talvez esses estejam presentes no outra metade do díptico, Cartas de Iwo Jima.

® Gonçalo Sá